Mulher morre por complicações em cirurgia para implante de silicone em Piracaia

Natacha Silvério estava internada em estado grave desde a cirurgia, em 27 de fevereiro. Ela teve a morte cerebral confirmada na tarde desta quarta-feira (9).

A Polícia Civil investiga um médico e a Santa Casa de Piracaia (SP) após uma paciente de 28 anos morrer por complicações de uma cirurgia de implante de próteses de silicone. Ela estava internada em estado grave desde o dia do procedimento, em 27 de fevereiro, e teve a morte cerebral confirmada nesta quarta-feira (9).

Santa Casa de Piracaia (Foto: Reprodução/ Street View)

Natacha Lopes Silvério passou pela cirurgia para o implante de duas próteses de 380 ml cada em um centro cirúrgico alugado no hospital pelo médico Pietro Petri. A família conta que a jovem não disse aos parentes e amigos que faria o procedimento e foi ao local sem acompanhante. Eles souberam da cirurgia após as complicações e dizem que houve negligência médica.

O médico Pietro Petri se apresenta nas redes sociais como membro titular do Colégio Brasileiro de Cirurgia Plástica (CBCP) e atua no Paraná e no interior paulista. Em 2020 ele foi acusado por pacientes de deixar sequelas após cirurgias estéticas (leia mais abaixo).

No caso de Natacha, o g1 apurou que o médico contratou uma sala no centro cirúrgico da Santa Casa. Com isso, teria direito a usar o espaço e os equipamentos durante o procedimento, além de uma sala de observação.

De acordo com a Polícia Civil, ele deixou a paciente sozinha no local após a cirurgia, quando teve a complicação e não foi socorrida. Ao g1, ele negou que a tivesse deixado sozinha e disse que ela ficou com a equipe médica do hospital (leia abaixo).

A família foi chamada pela Santa Casa depois das complicações. O advogado dos familiares, Carlos Henrique da Silva, explica que após o procedimento, ela teve uma paralisia pulmonar e, sem atendimento, o quadro se agravou.

“Em detrimento das medicações usadas para a anestesia, ela teve uma paralisia pulmonar. Como estava sem ventilação e não havia médicos, o quadro evoluiu para uma parada cardiorrespiratória. A Natacha permaneceu sozinha sem socorro até que uma médica passou na sala e percebeu. Ela chegou a ser intubada, mas constatou-se uma grave lesão cerebral por causa do tempo sem respiração e os médicos dizem que o quadro é irreversível”, explica Carlos.

A família também diz que a paciente não passou por todos os exames necessários para o procedimento.

“Tinha que ter alguém com ela o tempo todo. O que aconteceu poderia ter sido evitado se ela tivesse sido socorrida a tempo. A gente quer que ele seja responsabilizado, porque são vidas e ele vai continuar fazendo isso e destruindo famílias”, diz a prima, Tais Lopes. Natacha deixa três filhos, de quatro meses, três e seis anos.

A Polícia Civil apura quanto tempo a vítima ficou sem acompanhamento médico e se houve negligência. O delegado Luiz Carlos Ziliotti informou que o boletim de ocorrência foi registrado nesta terça-feira (8) e que acionou a Santa Casa pedindo os laudos e documentos, além das imagens das câmeras do local.

Foram ouvidos dois familiares e a partir desta quinta (10) ele vai ouvir os funcionários e médicos.O advogado da família informou que vai pedir na justiça a suspensão temporária do registro do profissional durante as investigações.

Acusação de negligência

De acordo com o advogado da família, além do abandono, a anestesia usada teria sido incorreta e causado as complicações. Natacha teve a cirurgia de prótese com anestesia local e sedação e não com anestesia geral.

Uma cirurgiã plástica renomada consultada pelo g1 explicou que na anestesia local com sedação barateia o processo, mas nela há um risco maior de haver parada respiratória. Se houver depressão respiratória, o anestesista precisa intubar a paciente e intervir na hora. Este tipo é o menos usado já que a anestesia geral é mais segura, mas exige que o paciente fique sob observação por mais tempo.

No caso de Natacha, o g1 apurou que a cirurgia foi feita pró-bono, sem que Petri cobrasse pelo serviço, apenas valores para exames e demais procedimentos.

O que dizem o médico e a Santa Casa

Ao g1, o médico Pietro Petri confirmou que ela fez a cirurgia com anestesia local com sedação e disse que após a cirurgia ela acordou, orientada e pediu água. Ele disse que ela passou por exames para realizar o procedimento e conta que estava fora do hospital quando foi comunicado sobre o agravamento do quadro dela.

“Fui buscar meu carimbo em casa. Quando estou saindo de lá, me ligaram dizendo que ela teve uma parada cardiorrespiratória. Ela estava na Repai [Recuperação Pós-anestésica], que fica dentro do centro cirúrgico e foi levada para o quarto sem meu conhecimento”, disse o médico Pietro Petri.

Já em nota, a Santa Casa de Piracaia confirmou que autorizou a utilização do centro cirúrgico pelo médico Pietro Petri para cirurgia de implante de prótese na paciente, no dia 27 de fevereiro.

Segundo o hospital, o contrato dá direito da utilização de espaço e equipamentos disponíveis no centro cirúrgico para que o médico e sua equipe realizem o procedimento agendado. O hospital informou que os funcionários não auxiliam em procedimento feito por equipe externa, apenas acompanham para inspecionar o uso de equipamentos da Santa Casa.

“A responsabilidade pelo acompanhamento da paciente até a sua alta é do médico e equipe que realiza o procedimento, eximindo a Santa Casa de toda e qualquer responsabilidade quanto ao monitoramento e assistência pós cirúrgica”, diz trecho da nota.

Atuação não reconhecida pela SBCP

Em nota, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) que o médico Pietro Petri não é cirurgião plástico, que ele não tem nenhuma especialidade cadastrada no Conselho Federal de Medicina (CFM) e por isso não tem como ele ser membro da entidade.

A entidade esclareceu que tem atuação científica e que, por isso, não há a obrigatoriedade do especialista de ser membro da SBCP para atuar.

Já o Colégio Brasileiro de Cirurgia Plástica (CBCP), citado por ele nas redes sociais, se apresenta no site como um “colegiado de médicos não somente cirurgiões, mas sim de todos aqueles que se identificam ou praticam a medicina visando a melhora da autoestima”. A entidade é um grupo particular e não tem atuação de fiscalização.

O que diz o Cremesp

O Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) informou que o médico tem duas penas publicadas no “Diário Oficial da União” de censura pública por infringir o código de ética médica, no Conselho Regional de Medicina de São Paulo e do Paraná.

“Por questões legais, o Cremesp só pode divulgar a pena de um profissional médico quando esta for transitada em julgado e publicada no DOU”, diz trecho da nota, que informa que ainda assim cabe recurso no Conselho Federal de Medicina, responsável pela determinação da sentença final e publicação da pena.

“O Conselho esclarece ainda que, apesar de poder prestar atendimento, sem especialidade, desde que se responsabilize pelos seus atos, o médico está impedido de se intitular e/ou divulgar títulos de especialidade que não tenham sido devidamente registrados junto ao Cremesp. Cabe ao médico comunicar a(s) especialidade(s) que possui ao Conselho”, disse a entidade.

O Cremesp informou ainda que não recebeu nenhuma denúncia formal sobre o caso da paciente Natacha Lopes Silvério, mas que ao saber do caso pela imprensa, vai abrir uma investigação.

Denúncias

Pietro Petri é alvo de uma série de denúncias de pacientes que relatam corpos deformados e complicações após cirurgias feitas por ele. Em uma das denúncias, feita em outubro de 2020, a paciente conta que também fazia um implante de seios e foi deixada sem médicos no centro cirúrgico.

Pietro Petri se apresenta como cirurgião geral e com especialização em cirurgia plástica, mas segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), não tem título de especialista.

O médico já foi punido com censura pública pelos conselhos regionais de medicina do Paraná e de São Paulo, em 2017, por infringir o código de ética médica.

No Paraná, pacientes também denunciaram problemas com o profissional. Ao menos nova entraram com uma ação na justiça contra o médico. Uma delas disse que foi anestesiada por uma auxiliar, não um médico anestesista, e que teve de ficar de quatro durante um procedimento.

O Conselho Regional de Medicina do Paraná iniciou processo ético profissional contra o médico para apurar a conduta, além da atuação em área sem o devido certificado e registro.

Fonte: G1.globo.com