Exercícios: O treino só é eficaz se você sentir dor no dia seguinte?

Especialistas explicam as dores musculares pós-exercício e tiram uma dúvida comum aos praticantes de atividades físicas.

O treino só é eficaz se você sentir dor muscular no dia seguinte? Chico Salgado, personal trainer de atrizes como Grazi Massafera, Angélica, Bruna Marquezine, Xuxa e Ingrid Guimarães, abriu uma caixinha de perguntas sobre treinos para os seguidores do Instagram e uma chamou sua atenção, pois perguntava justamente isso. O personal publicou, então, um vídeo comentando que muita gente acha que só fez um bom treino quando acorda cheio de dor. E que essa dor muscular nada mais é do que o rompimento das fibras musculares, microlesões normais comuns após o treinamento intenso.

(Imagem Ilustrativa de Scott Webb por Unsplash)

Chico explica que a dor muscular após o exercício é algo que qualquer praticante regular de exercícios provavelmente já enfrentou em algum momento e tem a ver com a realização de exercícios aos quais seu corpo não está acostumado, precisando se adaptar à prática aguda do exercício.

“A dor muscular aguda se dá pelo acúmulo de hidrogênio na molécula, essa alta concentração não permite que o ciclo de cori seja realizado de forma regular, aumentando agudamente o que chamamos na fisiologia de tamponamento”, explicou Chico, referindo-se, ao falar no ciclo de cori, à situação em que o metabolismo aeróbico não fornece a energia necessária e o músculo usa o glicogênio de reserva como fonte de energia.

Chico segue em uma explicação técnica e conclui:

“Aparentemente pode-se imaginar que trabalhar a níveis que promovem fadiga muscular ou microlesões seja negativo. No entanto, nossa musculatura trabalha por adaptações gradativas. Esta adaptação é benéfica ao treinamento, visto que promove melhora do tônus muscular e também da eficiência funcional da musculatura trabalhada”, argumenta o personal.

Ou seja: quando você se exercita da mesma maneira todos os dias, seu corpo se acostuma a trabalhar determinados grupos musculares, mas se você iniciar um novo treino de condicionamento físico ou treinar por mais tempo do que o normal, poderá acordar no dia seguinte com dores musculares. Mas são dores adaptativas ao treinamento e que vão trazer inúmeros benefícios ao metabolismo e à musculatura exercitada.

“Tem muita gente que gosta de sentir essa dor muscular e tem muita gente que usa essa dor muscular para se sabotar e não voltar no dia seguinte. Fique muito atento a isso e se essa dor muscular não sumir, procure um médico”, finalizou no vídeo

E afinal, tem que doer para ter efeito?

Não precisa doer, treinos que não levam a dores musculares também são eficazes, quando bem feitos. Inclusive há algumas evidências científicas apontando que há maior aumento de ganho muscular nos treinos sem dores. Mas essa falta de dor muscular pode ser interpretada como uma sinalização do momento de realizar a substituição do treino ou adaptar com cargas, intensidade e/ou frequência maiores.
Segundo o ortopedista Renan Bosio, a dor pós-treino é a chamada dor muscular “boa”, apontando que o treino possuiu intensidade, carga e/ou frequência suficientes para recrutar as fibras musculares. Não sentir dor muscular após o treino não significa necessariamente que o treino não foi eficaz, mas estaremos em um dilema de observar há quanto tempo já mantêm esse treino e se já não é momento de realizar troca/adaptação para novas cargas, frequências, exercícios, entre outros.

Sentir a dor muscular está relacionado à perspectiva de aumento de massa muscular, quando você também respeita o momento posterior de descanso do grupo muscular e não deixa faltar nutrientes, especialmente proteína, para a regeneração e síntese muscular.

A causa da dor muscular também está relacionada ao acúmulo de ácido lático e microlesões em fibras musculares após exercícios. Essas microlesões e o processo inflamatório desencadeado são importantes para o ganho de massa muscular no momento seguinte de regeneração dessas fibras e síntese proteica, conferindo além do reparo muscular, a hipertrofia.

O médico do esporte e endocrinologista Guilherme Renke explica ainda que a dor muscular de início tardio se desenvolve 24 a 48 horas após exercícios extenuantes, direcionados a ações musculares excêntricas (alongamento muscular) ou eventos extenuantes de resistência, como uma maratona. A dor é acompanhada por uma perda prolongada de força, uma amplitude de movimento reduzida e níveis elevados de creatina quinase (CPK) no sangue, inclusive os médicos do esporte podem usar esse marcador em alguns casos.

Como não confundir dor com lesão

De acordo com Renan:

A dor muscular “boa” costuma aparecer 24 horas após o treino e está localizada imediatamente no grupo muscular treinado, correspondente com o movimento realizado durante o treino. Após um ou dois dias, a dor cessa.

Já a dor que sinaliza uma lesão pode surgir de maneira imediata após o exercício e ter uma duração maior que 48 horas, normalmente relacionada a uma articulação (ombro, joelho, tornozelo, cotovelo, etc) e gerando limitação de movimentos.

Guilherme aponta que um fator importante para se observar e evitar as lesões, é o descondicionamento.

“As pessoas que iniciam uma atividade e estão sedentárias são as pessoas que vão acabar sentindo mais dor. Normalmente, isso diminui com a prática de exercício físico, a realização do treinamento, a produção da creatina quinase (CPK), existem suplementos que reduzem a CPK, como por exemplo a curcumina e o ômega 3, então é indicado que a pessoa procure um médico do esporte para avaliar eventualmente um ajuste na suplementação voltada para performance”, comenta.

Como diminuir a sensação de dor

A principal estratégia é o repouso. Evite trabalhar/recrutar novamente o grupo muscular enquanto ele estiver dolorido, o que vai representar um período de no mínimo 48h. Outras estratégias são a realização de massagem e gelo local.

Detalhe importantíssimo: evite a qualquer custo o uso de anti-inflamatórios, pois todo benefício dessa dor muscular com relação às microlesões das fibras musculares e o processo inflamatório para regeneração e ganho de massa muscular ficará comprometido.

O importante é descansar, mas não parar de treinar por sentir dores. Também não vale forçar os músculos em treinos pesados, que podem causar as lesões.

Fontes:
Chico Salgado (@chico_salgado) é profissional de educação física, faixa preta em Jiu-Jitsu – 5 grau.
Renan Bosio é médico ortopedista, especialista em Medicina do Esporte, afiliado do Instituto Nutrindo Ideais (@nutrindoideais)/Campinas, Mestre e Doutorando em Farmacologia/UNICAMP.
Guilherme Renke (@endocrinorenke) é médico endocrinologista e do esporte, mestre em cardiologia, sócio-fundador do Instituto Nutrindo Ideais (@nutrindoideais). Membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), Médico do Esporte com Título de Especialista pela Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte, Pós Graduado em Cardiologia pelo Instituto Nacional de Cardiologia do Rio de Janeiro, Mestre em Cardiologia (INC).

Fonte: EuAtleta